SÍNODO DA AMAZÔNIA | Entrevista com o salesiano Pe. Justino Sarmento, convidado especial da Assembléia Sinodal

SÍNODO DA AMAZÔNIA | Entrevista com o salesiano Pe. Justino Sarmento, convidado especial da Assembléia Sinodal
26 de setembro de 2019 Por pauloO Sínodo dos Bispos para a Região Panamazônica vai se realizar em Roma de 06 a 27 de outubro, com o tema ‘Amazônica: novos caminhos para a Igreja e para uma ecologia integral”.
O Sínodo da Amazônia foi, recentemente, objeto de estudo do clero da Arquidiocese de Olinda e Recife, com assessoria do padre Justino Sarmento, um padre indígena salesiano, da nação Tuyuca de São Gabriel da Cahoeira, que fica no Alto Rio Negro, Amazonas.
O sacerdote indígena integra a comissão mundial que vem colaborando há mais de dois anos para a preparação do Sínodo da Amazônia. Ele foi convocado pelo Papa Francisco como assessor especial do Sínodo.
NH: Quem é o indígena salesiano Pe. Justino? Qual a sua ligação com o Sínodo?
P. Justino: Nasci numa Aldeia denominada Onça Igarapé, situada no destrito de Pari Cachoeira, Amazonas, Brasil.
NH: Como o senhor chegou a ser um padre salesiano?
P. Justino: Eu fui aluno no internato de Pari Cachoeira, do ano de 1970 até 1979 e depois eu fui para o seguimento da vocação à vida salesiana no Centro Vocacional Salesiano, em Manaus, de 1980 até 1982. Prosseguindo o processo formativo, eu fui fazer o noviciado em São Carlos (SP), depois fiz minha primeira profissão religiosa e segui a etapa de pós-noviciado, estudo de filosofia, tirocínio, teologia e fui ordenado sacerdote no dia 2 de junho de 1994.
NH: Onde o senhor foi ordenado padre?
P. Justino: Fui ordenado na missão salesiana de Pari Cachoeira, onde fiz meus primeiros anos de estudo.
NH: E depois de padre, onde o senhor atuou?
P. Justino: Nesse período eu já estava atuando na Missão Salesiana de Iauaretê, na mesma região do Alto Rio Negro, onde eu comecei a viver minha vida sacerdotal com os povos indígenas, entre eles o Tucano, Tariano, Tuiuca, Piratapuia, Dessano, Uianano, Cubeu, Rupita – todos esses povos e outros que habitam a região. Foi com esse povo que eu comecei a sonhar e colocar em prática os meus desejos de fazer diferente a celebração de missas, criar canto na língua tucano, criação de textos bíblicos para a Eucaristia. Nós, como povos indígenas, começamos a introduzir nossos símbolos, instrumentos musicais e ritmos. Foi um momento muito importante na minha vida sacerdotal.
NH: Além dos cursos de filosofia que os padres fazem, o senhor fez outros cursos, não é verdade?
P. Justino: Eu fui estudar em São Paulo, na Faculdadee Teólogica Nossa Senhora da Assunção, onde fiz curso de Missiologia, em preparação à minha vida missionária. Também serviu para refletir minha prática missionária dos anos anteriores. Quando terminei, voltei para Manaus, onde eu fiquei atuando com nossos jovens salesianos estudantes de Filosofia, no ano de 2000.
NH: Sabemos que depois disso, o senhor foi pároco em Manaus, fez mestrado na Universidade Católica de Campo Grande, em Mato Grosso, na área de educação e voltou a trabalhar com os indígenas.
P. Justino: Em 2007, eu voltei a Iauaretê. Fiquei como encarregado da Missão Salesiana, como diretor e pároco. Foram os anos onde também comecei a cuidar mais das comunidades do interior para a formação das lideranças, catequistas, ministros extraordinários da Eucaritia…
NH: O senhor também esteve com os indígenas Ianomami?
P. Justino: De lá (Iauraetê), eu fui para outra missão salesiana, Missão Salesiana de Marauiá, com os povos Ianomami, onde fiquei ajudando com educação, catequese, para receberem os sacramentos à inciação cristã. Fiquei ali com esse povo até o ano de 2016.
NH: Com essa atuação entre as missões indígenas, como o senhor chegou a fazer doutorado em Antropologia Social?
P. Justino: Isso mesmo. Em 2017, eu fui para Manaus, iniciar meu doutorado na Universidade Federal do Amazonas.
NH: Como o senhor começou a ser envolvido com o Sínodo?
P. Justino: No início de 2018, em fevereiro, chegou o convite para eu compor o primeiro grupo de expertos para escrever os primeiros textos para o processo de preparação para o Sínodo da Amazônia.
NH: Com toda essa bagagem e com toda essa experiência missionária, o senhor tinha mesmo que ser convidado para colaborar com o Sínodo…
P. Justino: Eu vejo que todas as histórias anteriores da prática missionária que eu fazia, das coisas boas que conseguia fazer e das dificuldades que eu sentia, a busca de soluções e desafios despertaram os organizadores a pensar no meu nome como colaborador, desde o início da preparação do Sínodo da Amazônia.
NH: O fato do senhor estar colaborando há dois anos tem, com certeza, acrescentado e muito à sua vida missionária.
P. Justino: Tem sido um momento importante na minha vida, momento de aprendizado intenso, (oportunidade) também para contribuir, em nome dos povos indígenas, com os conhecimentos que nós temos e, porque não dizer, com as experiências da vida missionária que nós temos na região do Rio Negro, porque eu sou membro da congregação salesiana; eu tenho exercido isso em nome dos salesianos, em especial a Inspetoria São Domingos Sávio.
NH: O que os povos da Amazônia estão esperando do Sínodo?
P. Justino: O Sínodo da Amazônia desperta para os povos amazônicos muitas expectativas boas, novos sonhos, esperanças, novos tempos, novos compromissos, nova atenção em relação a questões levantadas durante as escutas. O Sínodo para nós, que estamos mais diretamente (envolvidos), é como uma voz profética a dizer: O mundo precisa mais de nossa atenção, de nosso compromisso. Precisamos rever algumas atitudes que não estão indo como Deus quer para o mundo. Então, tinha que vir esse Sínodo para chamar a atenção do mundo todo, os estados nacionais, da região panamazônica, da América Latina, entre outros continentes.
NH: Para o senhor, como alguém que se envolveu tanto na preparação e que vai à assembleia do Sínodo, qual sua expectativa?
P. Justino: Como alguém que participou diretamente da preparação, eu tenho grande esperança, assim como muitos povos amazônicos que contribuíram com suas propostas, com seus sonhos. Esperamos obter, com o Sínodo, diversas respostas, caso não forem imediatas, alguns critérios para nós entendermos melhor nossa Igreja, para cuidar do mundo.
Imagem: Pascom AOR